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No quadro de um novo mosaico da UE de proteção dos direitos do consumidor, consagra-se, no presente decreto-lei, a possibilidade de o consumidor optar diretamente entre a substituição do bem e a resolução do contrato, sem necessidade de verificação de qualquer condição específica, quando esteja em causa uma falta de conformidade que se manifeste nos primeiros 30 dias a contar da entrega do bem.
Eliminou-se ainda a obrigação que pendia sobre o consumidor de denunciar o defeito dentro de determinado prazo após o seu conhecimento, restabelecendo-se a inexistência de obstáculos ao exercício de direitos de que o consumidor dispõe durante o prazo de garantia dos bens.
Por outro lado, estabelecem-se obrigações a cargo do profissional quanto ao prazo de reparação, à recolha e remoção dos bens para reparação e à devolução do preço pago em caso da resolução do contrato.
Considerando que um dos desígnios da Diretiva que aqui se transpõe é a adequação do regime da conformidade dos bens à dimensão digital do mercado, assim assegurando um elevado nível de proteção do consumidor, o presente decreto-lei amplia a noção de «bens», de maneira a abranger os bens de consumo que incorporem ou estejam interligados com elementos digitais. De notar que o elemento digital poderá estar pré-instalado no bem ou ser instalado posteriormente, considerando-se bens com elementos digitais sempre que a ausência do conteúdo ou serviço digital incorporado ou interligado impeça os bens de desempenharem as suas funções, essenciais ou não.
Reforçam-se, ainda, no presente decreto-lei, os direitos do consumidor em caso de falta de conformidade dos bens imóveis, alargando-se o prazo de garantia dos bens imóveis a respeito de faltas de conformidade relativas a elementos construtivos estruturais para 10 anos, mantendo-se o atual prazo de 5 anos quanto às restantes faltas de conformidade, e incorporam-se, ainda, as soluções constantes do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de abril, na sua redação atual, sobre a possibilidade de o consumidor exercer os direitos de reparação e substituição do bem em caso de falta de conformidade diretamente perante o produtor, bem como a respeito do direito de regresso do profissional perante uma pessoa em estágios anteriores da cadeia contratual, quando esta seja responsável perante uma falta de conformidade.
A garantia voluntária é mantida, embora com obrigações de informação acrescidas, passando agora a designar-se por «garantia comercial».
Pretendendo contribuir para uma maior durabilidade dos bens e promover a reparação dos mesmos, estabelece-se o dever de o produtor disponibilizar peças sobresselentes durante um prazo de 10 anos após a colocação da última unidade do bem em mercado, de acordo com determinados requisitos, e ainda, no caso dos bens móveis sujeitos a registo, o dever de o profissional prestar, durante o mesmo período de tempo, um serviço de assistência pós-venda.
Por seu turno, o crescimento do comércio eletrónico registado na última década e a necessidade de potenciar as suas vantagens para o mercado interno levaram a Comissão Europeia a apresentar a Estratégia do Mercado Único Digital que, entre outros objetivos, visa impulsionar a economia digital, nomeadamente garantindo um melhor acesso dos consumidores aos conteúdos e serviços digitais e facilitando o seu fornecimento pelas empresas.
Neste contexto, a Comissão Europeia apresentou uma nova proposta legislativa que, após negociação no Conselho, veio a resultar na Diretiva (UE) 2019/770, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2019, relativa a certos aspetos relativos ao fornecimento de conteúdos e serviços digitais [Diretiva (UE) 2019/770].
A Diretiva (UE) 2019/770 vem colmatar um vazio legal a nível europeu no que respeita à consagração de direitos dos consumidores em caso de não fornecimento ou não conformidade dos conteúdos ou serviços digitais.
No que concerne ao fornecimento de conteúdos ou serviços digitais, a Diretiva (UE) 2019/770 aplica-se aos contratos que estipulem um único ato de fornecimento, uma série de atos individuais de fornecimento e, ainda, um fornecimento contínuo. Estão em causa, por exemplo, a compra de um livro digital (ebook), a subscrição de publicações periódicas e a subscrição de um serviço de streaming, respetivamente.
A Diretiva (UE) 2019/770 assegura que o consumidor que faculta dados pessoais para usufruir de um conteúdo ou serviço digital passa a estar protegido por um conjunto de direitos, caso ocorra o não fornecimento dos mesmos ou falta de conformidade.
Assentando no princípio da harmonização total, a Diretiva (UE) 2019/770 estabelece regras quanto ao fornecimento dos conteúdos e serviços digitais, prevendo o direito à resolução do contrato pelo consumidor em caso de não fornecimento, de acordo com determinadas regras, bem como em caso de falta de conformidade com determinados requisitos subjetivos e objetivos.
Concretamente, em caso de não conformidade dos conteúdos e serviços digitais, o consumidor tem o direito à reposição da conformidade, à redução do preço ou à resolução do contrato, estabelecendo-se as condições e requisitos aplicáveis.
Perante uma falta de conformidade, a Diretiva (UE) 2019/770 prevê diferentes prazos de responsabilidade do profissional consoante o tipo de fornecimento. Assim, nos contratos em que seja estipulado um ato único de fornecimento ou uma série de atos individuais de fornecimento o prazo de responsabilidade do profissional é de dois anos. Já nos contratos de fornecimento contínuo, o profissional é responsável durante todo o período de duração do contrato.
Contrariamente ao que se encontra previsto na Diretiva (UE) 2019/771, relativa a certos aspetos dos contratos de compra e venda de bens, que permite aos Estados-Membros estabelecerem um prazo de ónus da prova relativo à falta de conformidade entre um e dois anos, a Diretiva relativa aos conteúdos e serviços digitais estabelece prazos diferenciados para o ónus da prova consoante o tipo de fornecimento. Caso estejamos perante um ato único de fornecimento ou série de atos individuais de fornecimento, o prazo não pode ser superior a um ano. Por seu turno, nos contratos de fornecimento contínuo, o ónus da prova impende sobre o profissional durante o período de duração do contrato.
Considerando a importância crescente dos prestadores de mercado de linha nos contratos celebrados pelos consumidores, inova-se, ainda, ao estabelecer-se determinadas condições em que aqueles são considerados parceiros contratuais dos profissionais que disponibilizam bens, conteúdos ou serviços digitais através dos seus mercados em linha, prevendo-se, para o efeito, a possibilidade de os consumidores exercerem os seus direitos em caso de falta de conformidade também junto destes prestadores.
Finalmente, e com vista a assegurar o cumprimento dos dispositivos legais, estabelece-se um regime sancionatório, atribuindo-se à Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) e ao Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, I. P. (IMPIC, I. P.), competência para fiscalizarem, instruírem os processos de contraordenação e aplicarem as respetivas coimas e sanções acessórias no âmbito deste regime, sendo a competência do IMPIC, I. P., circunscrita ao regime aplicável aos bens imóveis.
O presente decreto-lei reforça, assim, os direitos dos consumidores na compra e venda de bens móveis, de bens imóveis, de conteúdos e serviços digitais, e procede à transposição para a ordem jurídica interna da Diretiva (UE) 2019/771 e da Diretiva (UE) 2019/770.